Jornacitec Botucatu, VI JORNACITEC - Jornada Científica e Tecnológica

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O CARÁTER NEURODEGENERATIVO DO TRANSTORNO BIPOLAR
Geisa Egypto Barbosa Caccere, Suzana Mara Julião, Camila Contin Diniz de Almeida Francia, Luis Alberto Domingo Francia Farje

Última alteração: 2017-10-10

Resumo


1 INTRODUÇÃO

O Transtorno Bipolar (TB) tem sido considerado um dos mais graves tipos de transtorno mental na atualidade, tendo como principal característica, a ocorrência de episódios de humor alternados, entre mania, hipomania e depressão, variando em intensidade, duração e frequência (PEREIRA, 2011). No DSM-V-TR (2014) o transtorno bipolar é interposto dentre as classificações dos “transtornos do espectro da esquizofrenia e outros transtornos psicóticos e transtornos depressivos em virtude do reconhecimento de seu lugar como uma ponte entre as duas classes diagnósticas em termos de sintomatologia, história familiar e genética” (DSM-V, 2014, p.123). Apesar de ser comumente tratado como uma mudança de humor repentina é uma patologia grave e muito mais complexa, que durante episódios de humor os pacientes demonstram déficits cognitivos em vários domínios (PEREIRA, 2011). Inclui-se prejuízo na função executiva, alterações na atenção, concentração e memória, além de apresentar alterações progressivas de volumes e morfologia cerebral, integridade neural e de função cognitiva. Esse declínio cognitivo pode estar relacionado com mecanismos de neuroproteção, dano oxidativo, e mediadores de inflamação (KAUER-SANT’ANNA, 2010). Sendo assim, o presente trabalho tem o objetivo de realizar uma revisão bibliográfica sobre o dano neurológico progressivo no Transtorno Bipolar e seu prejuízo na função cognitiva.

 

2 MATERIAL E MÉTODOS

Realizou-se uma pesquisa bibliográfica, utilizando-se as bases de dados Scielo, LILACS, Google Acadêmico, periódicos e bases bibliográficas. As principais obras selecionadas foram publicadas entre os anos 2011 e 2016.

 

 

 

3 RESULTADOS E DISCUSSÕES

De acordo com a Classificação de transtornos mentais e de comportamentos da CID-10 (1993), o Transtorno Bipolar é uma doença maníaco-depressiva, caracterizada por alteração de humor e o nível de atividade no qual o sujeito encontra-se profundamente perturbado, ou seja, é distúrbio caracterizado por elevação do humor e aumento da energia e da atividade, configurando a hipomania ou mania, e pelo rebaixamento do humor e de redução da energia e da atividade, isto é, a depressão.

Embora o TB seja considerado um transtorno mental, Cunha (2008) destaca os aspectos biológicos deste transtorno, relacionados à genética, vias neuro-hormonais, neuroplasticidade, neurotransmissão, estresse oxidativo, entre outros.

Segundo Kauer-Sant’anna (2010), estudos demonstram que o Transtorno Bipolar é de caráter progressivo, no qual apresenta redução de volume cerebral, mas evidente na substancia cinzenta, córtex pré-frontal e hipocampo, relacionando-se, provavelmente, com os déficits cognitivos. Particularmente, estudos post-mortem mostram uma redução do volume glial e das sinapses no hipocampo, córtex cingulado e núcleos accumbens. “Estudos neuropatológicos corroboram esses achados, demostrando redução da densidade glial e neural na região pré-frontal” (KAUER-SANT’ANNA, 2010, p. 211). Vieira, Souza e Kapczinski (2002) citam que as principais características que estão associadas as mudanças de células glias no TB são, atrofia celular no córtex pré-frontal e dorsolateral e orbitofrontal; morte celular no córtex pré-frontal subgenual; e aumento no número de células do hipotálamo e núcleo dorsal da rafe. O aumento nos níveis de noroadrenalina, que inibem a proliferação de astrócitos no córtex pré-frontal, pode ser uma predisposição maior para a perda de células glias em pacientes bipolares (VIEIRA; SOUZA; KAPCZINSKI, 2002). Além de todas essas alterações estruturais, para Kauer-Sant’anna (2010, p. 211):

 

[...] estudos de neuroimagem no TB demostram alterações funcionais em áreas como córtex pré-frontal, temporal e gânglios da base. Assim conceitualmente o TB tem sido proposto como uma patologia complexa, multifatorial e relacionada a alterações na plasticidade estrutural e funcional em neurônio e glia.

 

Conforme Vieira, Souza e Kapczinski (2002), os fatores neurotróficos, produzidos pelas glias, parecem serem fundamentais para a plasticidade e sobrevivência dos neurônios corticais, essa descoberta propõe que os astrócitos (por meio de indução glial de interações sinápticas e redirecionamento de neurônios secundários) modulam a plasticidade estrutural de neurônios e de diversos efeitos tróficos no cérebro de um adulto. Para Kauer-Sant’anna (2010), os responsáveis pelas conexões sinápticas e o crescimento neural são os fatores neurotróficos (neurotrofinas), sendo o BDNF (Brain Derived Neurotophic Factor) a neurotrofina mais estudada no Transtorno Bipolar, e que desempenha um papel fundamental na proteção e plasticidade neural, e “uma diminuição nos níveis circulantes de neurotrofina é prejudicial. ” (MAGALHÃES; FRIES; KAPCZINSKI, 2012).

Fries, Kunz e Kapczinski (2011) referem a importância do BDNF evidenciado em vários estudos, no qual demostram a importância da neurotrofina para a neuroplasticidade e cognição. Sendo que, em casos de episódios maníaco ou depressivo do Transtorno Bipolar, os níveis séricos de BDNF, estão diminuídos, comparados com controles. Essas pesquisas contribuem para a hipótese de que as alterações cerebrais presentes em pacientes com TB podem ser justificadas por essa alteração nas neurotrofinas. Tais níveis séricos de BDNF podem aumentar através do uso de antidepressivos e os estabilizadores de humor. Por consequência disso, tem sido sugerido, que a melhora clínica está associada à recuperação dos níveis de BDNF em pacientes bipolares internados em episódio agudo. Outras neurotrofinas (NT) também são relevantes no TB como mostram estudos que apontam alterações na NT3, NT4/5 e GDNF. Entretanto o BDNF é mais abundante no Sistema Nervoso Central, sendo o mais estudado (MAGALHÃES; FRIES; KAPCZINSKI, 2012). A alteração nas neurotrofinas pode explicar em partes as alterações cognitivas presentes no TB (KAUER-SANT’ANNA, 2010).

Segundo Magalhães, Fries e Kapczinski (2012), outro fator que está envolvido no Transtorno Bipolar, que associa vias disfuncionais e a mortalidade, são os mediadores inflamatórios. Essas substâncias, secretadas pelos macrófagos (células de defesa do organismo), são as citocinas pró-inflamatórias (TNF-a, IL-1B, IL-6 e IL-8), e são responsáveis pela indução da inflamação. Atualmente, a neuroinflamação está sendo investigada como um mecanismo da neuroprogressão com capacidade de causar toxidade e apoptose em neurônios e células gliais, que caracterizam os episódios de humor. Pesquisas têm demostrado o aumento dos níveis de citosinas, como a TNF-a e IL-6, durante os episódios de depressão e mania, em comparação com controles saudáveis. Esta substancia é uma das principais mediadoras pró-inflamatórias, e age na neuroplasticidade, resiliência e sobrevivência celular. De acordo com Kauer-Sant’Anna (2010, p. 212), no TB “é possível que o balanço entre os níveis de citocinas e de BDNF esteja envolvido na regulação da morte celular”.

Além disso, o estresse oxidativo também está sendo investigado, devido a sua presença, no TB. Evidencias mostram que diversas patologias, principalmente os transtornos psiquiátricos e neurológicos, envolvem radicais livres do oxigênio, isso porque o sistema nervoso central é vulnerável ao estresse oxidativo. E estudos demonstram o aumento dos níveis de estresse oxidativo no TB (KAUER-SANT’ANNA, 2010). Segundo Magalhães, Fries e Kapczinski (2012) oxidação é quando ocorre perda de elétrons, uma substancia é chamada de pró-oxidante quando recebe elétrons e aquela que doa é chamada de antioxidante. “O estado de estresse oxidativo é resultante de um desequilíbrio entre as moléculas pró-oxidantes e antioxidantes, comumente associado a danos celulares. ” (MAGALHÃES; FRIES; KAPCZINSKI, 2012). Há hipóteses de que a maior carga de estresse oxidativo, no TB, seja gerada por um distúrbio na função da mitocôndria. Estudos indicam que o dano oxidativo, no Transtorno Bipolar, é alto, além disso, os sistemas antioxidantes também parecem estar alterados, com aumento nos sistemas de glutationa e da superóxido dismutase (MAGALHÃES; FRIES; KAPCZINSKI, 2012).

 

4 CONCLUSÕES

Estudos vigentes demostram que o Transtorno Bipolar está associado a um processo neurodegenerativo, presente no córtex pré-frontal, substância cinzenta, hipocampo, córtex do cíngulo, núcleo accumbens, como também redução de volume de células da glia e neurônios. Portanto, o TB se relaciona com déficit cognitivo e disfunção progressiva. Esse conhecimento pode acarretar em um tratamento mais eficaz, através da prevenção da deterioração progressiva, proporcionando para o paciente, uma melhor qualidade de vida.


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